segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Na vida não há CTRL Z

Uma vez que externamos um pensamento ou executamos uma ação em direção a algo. Shazan! Foi-se. Eu, pelo menos, tenho uma enorme dificuldade em lidar com "nãos", tanto quando tenho que dizê-los quanto quando tenho que ouvì-los. E ainda exijo que os "nãos" sejam didaticamente assumidos. Não suporto sutilezas na hora de ouvir um "não". Preciso ouvir sonora e extravagantemente:
- Não!
Pode até ter um por isso ou por aquilo. Mas é um não categórico. Se deixar uma pontinha de dúvida eu vou insistir em achar que não ficou claro.
Eu sei que os nãos são importantes. Geralmente trazem mais movimentos do que os "sim". Inquietações que acabam gerando reações. Sair da zona de conforto é importante e terapêutico.
O fato é que a história da minha vida é querer dizer não e dizer sim. Faço centenas de coisas contrariada porque acho que é bom para mim . Acho que é só uma concessão, que vale o sacrifício. E aí vem a parte mais interessante. Acabo gostando e ou saindo com vantagens disso.
Eu tenho uma amiga, ou nem tanto, acho que posso dizer, colega. Ela me disse uma vez:
- Seja lá o que eu for solicitada a fazer, a resposta já é sim, desde agora.
Achei esta uma das atitudes mais corajosas e positivas que já vi. Acho que é uma boa forma de não ter que enfrentar a minha grande questão.
Se for sempre sim, já estou preparada e pronto.
Os "sim" que dizemos trazem consigo toda uma repercussão e , de carona, as coisas legais que se oportunizam quando dizemos sim para a vida.
Por que eu estou delirando?
Porque eu me propus a sair da zona de conforto e agora estou em desalinho com meus desejos. Mudar é assim tem o bom e o ruim. Tudo tem um aspecto positivo e outro nem tanto.
Na vida não há CTRL Z, não dá simplesmente para desfazer a ação a qual se comprometeu e não arcar com consequências sérias. Decepcionar pessoas, quebrar com sua palavra, o que considero muito , muito grave.
Por outro lado, voltar atrás também é uma atitude corajosa. Assumir um erro e fazer aquilo que realmente se quer!!! Enfim....o fato é que sei lá!
Diz a sabedoria popular "ajoelhou tem que rezar"!
beijo
ô

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Desejo apenas tudo...

Eu pretendia que a Linda O´Mahley fosse uma parte divertida e leve, mas acabou sendo uma face mais séria e acabada. Não quis brincar, não quis fazer graça e nem usar o humor picante e corrosivo que eu aprecio tanto. A Linda O'Mahley é simplesmente de verdade.
A verdade que eu sou. Eu sou a gota d'água, a tangente , a enchente e tudo que existe entre o oito e o oitenta.
Não me importa que o mundo ignore as rotações do planeta e que me esqueçam um dia ou nem lembrem. Desejo apenas viver até a última gota, olhar nos olhos , respirar com força e não compreender nunca nada, porque fórmulas são para regras e quando falamos de gente não há regras, não há modelos , não há tribo, somos todos uns estranhos caminhando sobre a Terra e isso nos torna muito próximos uns dos outros. O que nos une de fato é nossa estranheza. Ficamos procurando em nós os outros e nos procurando em tudo e todo. Morremos de expectativa do próximo ato, mas sabemos que não há princípio e fim , isso é apenas para os contos de fadas. Somos aquela cobra comendo o próprio rabo.
Cada espelho que nos reflete leva um pouco da nossa estranheza e nos revela um pouco mais. Nos dá de comer na boca, nos ensina sobre nossa estadia plena pelo tempo.
Eu sou esta performance pirotécnica de mim mesma. Sou minha piada e meu riso.
E assim pratico a varredura do pleno e me encontro esparramada em grânulos microscópicos por tudo que meus lapsos permitem .
Como diria Clarisse, entre um e dois , entre uma palavra e outra , um intervalo de intervalos e assim é....
beijos beijos
da Linda

Eu estou eu...

Linda O´Mahley anda desaparecida. O caráter investigativo da persona anda um tanto adormecido. Talvez por conta do excesso de "vrittis" ou mesmo por preguiça. É , acho que a última opção.
A agitação de final de ano não deveria me afetar, afinal eu não sou adepta das comemorações natalinas e muito menos de fechamento de ciclos de tempo no calendário, prefiro os ciclos de tempo natural.
Entretanto estou eu aqui, acelerada, impaciente e com vontade de fazer toda minha vida caber dentro de cada segundo.
Enquanto alguns fazem profecias e outros fazem planos, eu estou aqui na sombra desta árvore da vida que é a minha história. Não sei se isto é bom ou ruim. Sei que não me desconcerta.
Há padrões por aí e acho que são estes padrões que, por muito acelerados que são, fazem com que me sinta uma tartaruga no deserto. Mas é só apertar "on" e voltar ao prumo para dar-me conta de que tudo está bem no seu lugar.
Eu estou bem no meu lugar. Eu estou bem. Eu estou . Eu.
Eu, primeira pessoa do singular. Eu , personalidade . Eu , indivíduo metafisicamente falando. Eu, existência. Eu estou aqui. Eu estou. Eu.
Eu estou eu.
Isto é muito irado. Estar inteiramente dentro de um instante , não sei precisar que milésimo infinitésimo de tempo é este, mas de uma magnitude absurda. Consigo me acordar a tempo, sem nenhum transtorno. Eu estou eu. Eu estou .
Parafraseando alguém, consubstanciam-se eu e não-eu, universo adentro e Shazan....

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

@Quer falar sobre mediocridade?

Não sei a razão pela qual eu senti vontade de começar este post e muito menos se vou ter o mesmo ímpeto para terminá-lo. O tema é a mediocridade, a minha própria mediocridade.
Tudo começou com a primeira vez que identifiquei em mim uma necessidade de aparentar ser o que não sou antes mesmo de dar-me conta de que estava fazendo isto. Eu tinha uns onze ou doze anos e adquiri o hábito de decorar palavras do dicionário e usá-las em meu dia a dia em meio a minhas frases de "menor alienada". Adorava palavras com "b" ou "d" mudo , tipo, indadvertidamente ou substancial, mas a minha grande vedete foi a palavra "medíocre". Hoje lembrei disso sob a água morna do chuveiro.
Após nosso encontro no dicionário pedi ao meu pai que me explicasse. Eu preferia porque ele sempre usava um exemplo e eu associava rápido. Entretanto ele talvez tenha usado um exemplo preconceituoso a ponto de me fazer associar a mediocridade a fraqueza e covardia. Ambos crimes perdoáveis e absolutamente humanos. Mas para mim se tornaram pecados inaceitáveis.

Aos doze anos eu aprendi a fumar sem tragar, escondido , é óbvio. Pegava cigarros da minha mãe, pintava a boca de vermelho e ficava articulando as palavras que escolhera , entre bocas e expressões. Falar "medíocre" na frente do espelho era o máximo. Eu subia no pedestal do meu ego e acusava o mundo enquanto erguia a sobrancelha:

- Medíocre!

Ridículo? Generosidade! Mas não mudei muito de lá para cá. Continuo com fixação em espelhos e amo palavras. Redondas , longas, profundas , rasas, vagas, cheias e vazias. Acho que melhorei um pouco a estética.

A alegria daqueles momentos de pura teatralidade durou até minha mãe descobrir o desaparecimento dos cigarros e paguei o preço por meu espalhafato exibicionista.

Mas hoje, quando começei a pensar sobre minha mediocridade descobri que o conceito que aprendi no dicionário não serve mais. Acho que a mediocridade é uma criação do senso comum. O que é afinal "ser medíocre"? E melhor " e daí"?

Com o meu estilo soda cáustica de ser eu sempre usei o doce, o ácido e o corrosivo para abordar as questões mais elementares. Acredito que isto começou com meu encontro com o dicionário aos onze. Talvez fossem nove. Ali eu começei a comparar o que tinha que ser e o que eu gostaria que fosse. Aí me perdi. Que pena.

Tornei-me cada vez mais insatisfeita com minhas conquistas ou vitórias. Azar o meu.

Acho que identifiquei uma diferença essencial entre o que queremos e o que precisamos fazer. E assim uma diferença essencial entre ser medíocre e escolher ser o que é (medíocre?). Não sei se é uma questão de semântica. Não há mediocridade se alguém é feliz com sua atitude. A mediocridade é o olhar do que confere, do que compara, julga. Eu nunca mais consegui ficar sem comparar. O medíocre é o que se distancia de nosso critérios.

Afinal encontrei o homem médio, procurado pelos operadores de todas as ciências humanas, o homem comum e ponto.
Se a mediocridade é caracterizada pela falta de mérito é necessário estabelecer qual mérito? Qual a medida para o mérito? O esforço, o empenho, o desejo, o sonho?

Fiquei tentando lembrar de algumas pessoas do tipo bege, mas satisfeitas. Conheço algumas pessoas que estão conformes consigo , pelo menos aparentemente e notei que não são exicionistas. Não passam batom e ficam falando na frente do espelho. Provavelmente achem isto um despautério. São beges, comuns, transparentes. E daí?

Ao abordar minha própria mediocridade e meu severo critério de julgamento formatado pelos sucessivos equívocos nas minhas interpretações da vida eu me declaro um ser comum!
Bem vinda ao mundo real!
beijos medíocres
by Linda O'Mahley

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Sabe onde comprar um manual de instruções?

Eu preciso montar um manual de instruções sobre como lidar comigo e tê-lo sempre a mão a fim de que nos mais diversos momentos em que eu me choque com minha própria resistência eu possa lançar mão das informações e impedir um estrago maior. Eu tenho muitas páginas escritas deste manual, mas inúmeras se contradizem. Sinal de que eu sou uma contradição.
Hoje em dia tudo tem manual, como chegar, como montar , como sair do poço, de auto-ajuda , de beleza, de boas maneiras, de etiqueta, de moda, de protocolo básico, do ....
Pois é , a menos que se tenha um consultor particular, especialista na cátedra, minha própria essência, fica muito difícil estar preparada para tudo. O remédio é, se não estou pronta, remedia-se! Que pérola de sabedoria! Tudo se acomoda na natureza e portanto na vida , como uma lição de Darwin!
(Como é difícil escrever na primeira pessoa. Fica como uma declaração.)
O fato é que estou me preparando para confessar a mim mesma que devo arrancar as páginas viciadas de meu manual ainda em rascunho. Aquelas que falam do enfadonho e abominável senso comum. Aquelas que determinam que devo esperar de mim mesma o que todos esperam(eles, o senso comum).Isto não é possível!
Hoje quando eu estava lendo um texto sobre a igualdade, que não a social ou jurídica, percebi que a igualdade só é possível por rasos momentos, até que alguém de idênticas ferramentas mude de nível ou plano , como nos átomos que são alterados por suas energias. Lembrei do diagrama de pauling. Eca.
Somos nós elétrons saltitantes esperando vaga em outro plano?
É , acho que estou falando do livro da vida, das regras que a natureza, ou existência estabeleceu muito antes de surgirmos como espécie ou de inventarmos as convenções sociais e os parâmetros.
A célula ancestral, aquela do coacervado, já tinha em seu conteúdo a inteligência do " fazer limonada do limão"!!
Bjs saltitantes delirantes......


domingo, 2 de agosto de 2009

Relãções perigosas

Eu hoje fiquei pensando, como coisa que isto fosse novidade, eu penso o tempo inteiro. Talvez nem sempre controle meus pensamentos, mas não consigo simplesmente apertar no off, embora às vezes devesse. Eu sei é que enquanto assistia um filme notei cenas absurdas,pause, tipo, crianças desmantelando vaga-lumes com raquetes ao som de notas suaves e bucólicas ao piano. Crianças ingênuas explodindo cardumes em um lindo lago. Será que eu estou ficando doida ou isto é o fim da picada? Doeu viu?
Tudo bem que as pessoas são imprevisíveis e as crianças até são cruéis, afinal estão testando seus sentimentos e sob período de teste e avaliação podem ocorrer deslizes. Eu hein?!
Mas os filmes sempre gostam de tocar em temas que se repetem. Pais e filhos. Relacionamentos entre pais e filhos, daqueles que não podem mais ser resgatados e transformam-se em uma mágoa, uma lembrança aborrecida, um trauma, um afeto não trabalhado. Pessoas, elas mesmas, sujeitas a todo tipo de cegueira, como se se habituassem a viver de forma errada com seus sentimentos e no final, não sabem mais como fazer certo. Isso é tão comum.
É muito fácil tornar-se um estranho perante uma pessoa que fez parte da sua vida por muito tempo, embora pareça impossível.
Na infância, geralmente os pais são heróis, são a imagem da virtude, da segurança e dos valores que carregamos por toda uma vida. Se os pais esquecem de ser pais ou não percebem isto, vão colher os resultados com certeza.
O sentir dos filhos corresponde ao que receberam , certo? Se recebem afeto, devolvem afeto, se recebem atenção devolvem atenção, se ganham amor, retribuem amor. Se são tratados com justiça e correção, vão tratar os outros com justiça e correção. Parece tão simples. Então porque vemos tantas aberrações e tantos desajustes.
Eu mesma, em algum momento , tornei-me uma estranha para mim mesma, para meu pai também, com certeza. Nos perdemos. Anulamos nossos sentimentos de pai e filha. Perdemos o fio da conversa. O que hoje vejo com tanta clareza, antes nem percebia. Eu sempre achava que os pais eram responsáveis por tudo e ponto. Subaproveitamos nossa história. Simples. Não foi nenhuma catástrofe, mas merecíamos ser mais atentos.
Entretanto, penso que somos levados pela cultura corrente a imaginar este tipo de responsabilidade. Não é assim que as coisas acontecem. Existem histórias,contextos por trás das pessoas que também as impedem de perceber suas falhas. Juntar várias pessoas em um grupo, uma famíia, por laços e sentimentos, é uma situação com muitos meandros, muitas particularidades de cada um e do todo.
Acima de tudo , somos muito vaidosos e ególatras para olhar quem está ao lado. Os pais também, preferem não demonstrar sua fragilidade e sua falibilidade e fazem crer aos filhos que não podem vacilar. Quando fracassam torna-se algo muito grave.
Pais abandonam seus sonhos pelo caminho e nem percebem que crianças captam tudo com sua anteninha e estes significados passam a representar muito em suas vidas adultas.
Não existem receitas, não mesmo, mas acho que os filhos querem mesmo é atenção e amor. Precisam ser queridos e ouvidos. O resto se obtém com uma boa e franca conversa. Afinal de contas, são estas experiências que nos tornam melhores e mais interessantes, o resto é perfumaria.

terça-feira, 28 de julho de 2009

reminiscências

Reminiscências...
Eu me reportei a várias memórias soltas, aparentemente, após assistir dois filmes, já lançados há tempos , mas que só agora assisti.Um deles foi "O ano em que meus pais saíram de férias" dirigido pelo Cao Hamburger um filme espetacular e o outro " Um certo olhar", com direção de Marc Evans e também uma boa forma de entretenimento e crescimento interior.
Afora o fato de ambos serem bons filmes, tinham em comum personagens que usavam brilhantemente a capacidade de abstrair realidades duras. A diferença está claramente no olhar que lançamos sobre uma realidade.
No primeiro, um garoto que se vê sozinho em meio a um universo estranho e até um pouco hostil, criando um mundo próprio e lúdico a fim de alienar-se da dura condição na qual se encontrava . No segundo , a morte brusca de uma jovem que, também por ter crescido em uma condição extremamente complicada( sendo filha de uma autista de alta habilidade)lançava-se a conhecer pessoas e criar personagens para suas pretensas histórias de ficção. Queria ser escritora.
Fui de imediato remetida à minha infância, que foi marcada por momentos um tanto incomuns durante um certo período. Lembrei de um trecho de um romance de Tolstói " Todas as famílias felizes são parecidas entre si. As infelizes são infelizes cada uma a sua maneira".
Eu venho de uma família matriarcal moderna pelo lado materno. Minha mãe deu continuidade a linha de ação de minha avó , Martina. Ela foi mãe de treze filhos e trazia-os contidos em sua imagem dominante, criando um padrão de força e valor difícil de ser atingido por qualquer mortal. Talvez porque as condições adversas a que foi submetida pela vida tenham permitido que desenvolvesse tais habilidades. Um ser vigoroso e incansável. Nascida em 1908, casada aos quatorze anos e mãe de sucessivamente treze crianças. Marido ausente, guerras , recessão, privação ,e repressão eram marcas indeléveis desta geração. Minha avó era uruguaia, nascida em Melo. Voz grave, corpo troncudo, olhar doce e marcado pela história difícil que trilhou. Imensa capacidade de labor e renovação de tudo aquilo que tocava. Panos muito brancos, rendas muito engomadas, tudo muito limpo , alimentos bem preparados. São lembranças que guardei até quase poder tocá-las, embora minha avó tenha falecido aos 64 anos , por inúmeras complicações que a levaram muito rápido. Dos treze filhos, dois morreram ainda bebês, fato comum nos dias que viveu, os demais foram talhados por sua verve indômita e por seu imenso talento para forjar novas e melhores realidades para os seus.
Dentro de sua solidão, povoada pela imensa família que criou espraiou nas mulheres a semente de sua força, já nos filhos homens a sombra foi capaz de ofuscar suas vitórias e exaltar seus fracassos. As seis mulheres sobressairam-se. Criaram famílias, trabalharam e transformaram a dura realidade da qual foram protagonistas em sua infância e juventude. Sempre muito difícil e truncado , o futuro aconteceu e as adversidades foram superadas. O país se modernizou e vieram as novas gerações, poupadas das condições difíceis que elas conheceram intimamente.
Minha mãe herdou o cetro , como filha mulher e mais velha das mulheres, substituiu minha avó perante a família e tornou-se a sucessora. Minha avó ao partir deixou aos cuidados de minha mãe toda a sua prole.
Não é preciso dizer o impacto que a morte de minha avó gerou sobre todos e dos tempos difíceis que seriam até transitar aquela perda.
Minha mãe fechou-se em copas, tornou-se sombria e circunspecta. Não entendiamos.
A herança de minha mãe não foi simples. Um de meus tios, dos mais jovens, entregue ao alcolismo e sujeito a sucessivas internações passou a ser monitorado por minha mãe, embora pouco tempo depois acabasse morrendo, aos 32 anos.
O que sei é que durante este período inicial a vida em minha casa tornou-se muito triste e silenciosa e deixou dores provavelmente ainda encobertas pelo ritmo no qual a vida se move.
Os domingos passaram a ser vividos em duas partes, pela manhã, eu e meu irmão brincavamos em casa e nos preparavamos para a tarde, na qual a programação era invariavelmente visitar o cemitério e limpar o túmulo de minha avó e posteriormente dar uma passada no sanatório local onde meu tio ficava internado.
Apesar de mórbido demais , aparentemente, lembro deste período com compaixão e até uma certa nostalgia. Tudo devido ao meu olhar de criança e a minha capacidade de imaginar histórias e me encantar com aqueles detalhes.
No cemitério meu pai e meu irmão não desciam do carro , meu irmão lia vorazmente tudo o que via, sua técnica de superação, instintiva, enquanto meu pai pacientemente esperava e conspirava para o alívio das dores de minha mãe.
Eu adorava brincar perto de uma fonte de água, que eu pensava como uma piscina de cemitério em minha fantasia infantil, mas o melhor era olhar as fotos das lápides e os nomes incrívelmente engraçados. Ficava encantada olhando as fotos e imagens e pensando sobre suas histórias, suas expressões orgulhosas e imponentes diante daquela cena de morte. Alguns tinham o olhar triste e sorumbático, outros pareciam mesmo mortos em suas fotos. Algumas lápides eram lindas, verdadeiros palacetes e tinham anjos , demônios e santos, degraus como se elevassem o túmulo ao céu.Capelas pequeninas. Então se eu achasse algum mausoléu com a porta aberta era o êxtase. Aquilo era o máximo, eu quase podia vê-los , meus personagens, aliás, sentia como se os conhecesse, me apropriava de suas histórias e acabavam sendo minhas companhias naquele brinquedo aparentemente lúgubre. São histórias deliciosas que residem em minhas memórias.
Saindo daquele universo fantasmagórico era hora de visitar o sanatório, no qual eu não podia entrar e era uma tortura esperar até que minha mãe retornasse contando aquelas passagens hilariantes protagonizadas pelos moradores daquele estranho lugar aos meus olhos. Meu grande sonho era transpor aqueles portões enormes que davam asas a minha imaginação. Minha mãe que saía do carro munida de maços de cigarros, biscoitos e balas retornava cheia de histórias suculentas que eu ouvia hipnotizada e quase podia sentir e ver aquelas pessoas esquisitas que ela descrevia em atitudes impróprias , mas que para mim eram parte da brincadeira. Quando os moradores estavam muito agitados as visitas eram curtas e percebia-se a agitação. Eram todos personagens de minhas histórias infantis. Afinal para uma criança cantar e dançar pelado ou fingir que é uma galinha são fatos absolutamente comuns. Aqueles eram momentos muito alegres porque eu podia ver minha mãe sorrindo e se surpreendendo com coisas que eu entendia muito bem.
É o olhar que emprestamos aos fatos que acaba tornando-os magníficos , ricos e inesquecíveis. Agradeço a esses tempos pelo treinamento intensivo que vivi em minha criatividade. Guardo muito desta criança que se encantou até com a tristeza e conseguiu extrair dela uma tela colorida e que vive em minhas memórias . É a leveza que precisamos aprender com as crianças ou pelo menos não podemos desaprender ao tornarmo-nos crescidos e que pode fazer da vida uma lição prazerosa sobre amar, compreender , respeitar e aceitar.

sábado, 4 de julho de 2009

Eu e a água......

Eu hoje vivi um momento interessante. A água tem um papel muito importante na minha vida. Através da água eu me renovo. Quando estou tensa procuro a água, quando estou alegre procuro a água, quando preciso pensar igualmente procuro a água.
Faz um tempo eu passei por uma tensão forte( acho que a mais forte que eu lembro) na qual eu tinha que tomar uma decisão de como agir e mudar algo que estava desabando. Quando tenho problemas, a primeira coisa que me falta é o sono e achei que baixando minha temperatura com um banho frio, a reação me deixaria mais calma. Sob a água fiquei um tempão e me passaram milhares de vidas na cabeça. Pensei se eu estava no tão famoso chão. Aquele que dizem que ninguém passa. Lá eu chorei e chorei e pensei e gastei algumas dezemas de litros de água( que os xiitas não me escutem) e concluí que se estava no chão , este era muito melhor do que eu pensava. Talvez porque fosse um chão apenas dentro de mim.
Bom, o episódio se resolveu. Igualmente não relaxei e nem dormi, mas resolvi o problema.Ou o problema se resolveu.
Hoje vivi um momento proporcionalmente inverso. Estou muito bem e tomei um longo banho quente para me aquecer, depois de ter assistido a um belo filme de amor! Fiquei lá , sob a água e de olhos fechados e senti como se não fosse mais eu. Eu era como a água que fluía. Lembrei daquele dia e pensei que me sentia curada de mim mesma.
Quando eu penso que já se passaram 45 anos e eu ainda não fiquei velha.
Assisti um filme chamado " Entre lençóis", que poderia ser uma piada vulgar. Não é! Valeu a pena porque, além de ter duas obras primas da natureza em nu, Reinaldo Giannechine e Paola Oliveira , que são muito lindos, o mais fascinante é que a verdadeira beleza era a que os atores emprestaram aos personagens. Deram de seu conteúdo mais humano. Muito legal ver como se tornaram tão mais belos porque mostravam suas feiúras, suas inseguranças, falhas.
Acho que é isso o que eu venho pensando ultimamente, que o que torna um episódio legal não é sua casca, mas seu conteúdo. O conteúdo que seus personagens emprestam a ele.
Será que eu não consigo mostrar minhas feiúras e me torno uma casca oca e morta? Um pirão sem sal?Um Claudinho sem Bochecha?
Eu também descobri que escrever é verdadeiramente mágico. Fantástico. Pura adrenalina. Ainda não descobri se é pra sempre...
Não sei se esse diário pretende falar de coisas convencionais , de metafísica, de emoções, mentiras sinceras que me interessam.
Ainda relendo , me peguei falando na primeira pessoa do plural! Fugindo da raia! Eu não preciso que 6 bilhões de pessoas sejam como eu.

domingo, 28 de junho de 2009

Dia 2 do começo de Linda O'Mahley

Adorei a frase do Divã, o filme: Se tive problemas na vida, nao foi por falta de felicidade!"

Eu sei é que ao longo dessas décadas já vivi tantas vidas e parece que estive parada no mesmo lugar. É verdade isso de vivermos muitas vidas em uma. Hoje estamos cercados por um grupo de pessoas, temos laços e vínculos com elas e são determinantes em nossa vida, às vezes, num piscar de olhos o cenário muda, nada mais resta daquilo e o que era o ar que respirávamos tornou-se poeira em nossa memória. Será que não dá mesmo pra fugir do clichê?

Lembro de uma série de TV onde o personagem principal era um simulador, que poderia ser quem quisesse? Olha que delírio! O fato é que podemos ser quem escolhermos, mas precisamos remover os grilhões! É tão difícil sair da zona de conforto. È tão complicado sair de dentro da prisão do lugar comum. O novo é tão sonhado e na hora de agarrar o prêmio dá vontade de desistir!

Eu confesso que fico mimando e acalentando alguns vícios da minha vida que sei que são um atraso, mas são íntimos e conhecidos velhos. É mais fácil lidar com coisas familiares! Isto é um desacato!

Talvez eu tenha imaginado que seria uma predestinada e que magicamente saberia ler os sinais, que os sinais me indicariam o caminho a seguir e assim eu cumpriria os ítens da receita e o produto estaria ali. Sem surpresas. Como fui lesa.

Tudo foi lento e indefinido e eu deixei a indefinição ser minha marca registrada. Sempre agi com a vida como se as opções não fossem minhas e sim do acaso. Tudo aconteceu e eu apenas embarquei em tempo.

Não fiz muita questão de marcar o território nem de parecer a opção correta, mas não aceito me enquadrar nos modelos de felicidade que estão à minha frente. Acho que resisti tanto a eles que caí num limbo e la ironicamente encontrei os supostamente enquadrados também. Sempre vai haver uma porta que estará fechada. E eu aqui no portal.
Talvez, na verdade, eu quisesse apenas um desses modelos prontos! Talvez eu tivesse medo de falhar, de descobrir que não posso!
Eu sempre imagino o que teria sido de mim se tivesse ficado com a outra opção!
Se eu tivesse me tornado a gorda que tenho tanto medo de ser? Se eu tivesse assumido a feia que tenho tanto medo de ser? Se eu tivesse me tornado a burra que tenho medo de ser.
Está vendo, tudo é definitivo. Estou sendo maniqueísta mesmo. Ou se é gorda( não se está gorda). Ou se é feia ( não está feia) . Ou é burra( não está sendo burra). O definitivo está sempre presente. Tudo parece pra sempre! Pra sempre!
Mas, voltando , se eu tivesse sido a burra , feia , gorda?Será que eu não estaria mais confortável.
Outro dia eu li um crônica da Lia Luft onde ela dizia o quanto é difícil ser "feliz", ironizando sobre o modelo ou rótulo do que todos acreditam ser a felicidade. Ser é difícil. Ser tantas coisas é impossível. Eu sei disso ! E daí? Isso muda alguma coisa dentro de mim e sobre mim? Talvez.
O difícil é ser a bruxa e ao mesmo tempo a gata borralheira!

Tenho muitas amigas e todas diferentes, cada uma em sintonia com uma parte de mim, mas todas acertaram em algum ponto. Há um momento em que o dial sintoniza claramente a que vieram, sem ruídos nem interferências. A música toca.

Eu me sinto como alguém que não está na festa porque quer,mas porque tem que estar. É onde deve estar, mas fico contando os minutos para acabar e poder ir embora e ficar aliviada porque consegui estar lá e fingir que estava ótimo por tempo suficiente e deu tudo certo . Poder contar depois como estava ótimo. Eu consegui enganar os bobos!

Eu detesto e sempre detestei festas convencionais, como formaturas, casamentos , aniversários de crianças, batizados e demais eventos familiares. O que há de errado comigo? Sem falar do Natal ! Só que às vezes me pego gostando pelas beirinhas! Dá pra entender onde foi que a placa começou a deslizar? Eu só sinto a crosta rachando!

Tenho medo, mas topei o desafio!
Eu não tenho medo de perder o juízo. Eu até gostaria de delirar um pouco, eu tenho medo é da minha própria polícia, diuturnamente vigilante e cujas punições são tão mais severas. Não admito minha humanidade e ponto.
Enquanto isso a criança fica lá, dentro de mim, chorando sozinha.
Eu continuo vendo e vivendo tudo enquadrado, remoto controle. Grande ilusão.
Eu sempre costumava pensar, quando me sentia cansada de tudo, que logo eu estaria velhinha e não teria mais que ficar me fazendo desafios ou provando pra torcida do Grêmio que eu posso isso ou aquilo ( entenda-se torcida do Grêmio o meu exército vigilante). É como aquela festa que já falei, logo ela acaba e só é preciso lembrar dos acontecimentos, pintar com uma cor que não seja muito distante da verdade e fazer de conta que foi como tinha que ser.
Eu sempre encurtava fantasiosamente o caminho entre o nascimento e a morte.
Décadas e décadas e a ânsia por viver ou descobrir o significado de tudo, como se tudo tivesse que ser um grande acontecimento , cheio de profundidade..., a ânsia só aumentou. Será que aos noventa vou viver a hecatombe!
Eu adoro temporais, adoro o barulho do vento. Adoro quando o tempo enlouquece!
Eu continuo vendo e revendo tudo enquadrado, remoto controle! Grande ilusão!

sábado, 27 de junho de 2009

O diário de Linda O' Mahley

Não sei em que dia eu esqueci que as roupas são feitas para vestir e não para nos diferenciar das outras pessoas, mas foi mais ou menos na mesma época em que me perdi de mim mesma.
Eu lembro que aos dezenove eu conseguia usar saia jeans rodada com babado rosa pink e meia de lycra verde bandeira, me achava o máximo. Talvez porque estivesse vertendo a expressão de mim mesma, sem medo de ser ridícula.
Eu me vejo agora, fixada em uma infinidade de coisas que não tem o menor sentido e fico me perguntando se estamos aqui para fazer sentido.... O que importa é que eu estou procurando o caminho de volta. Estou procurando a cura deste medo de viver e de repente , num golpe do destino, decobrir que é realmente bom e que deve ser assim!
Começei a me flagrar observando pessoas e achando que quase tudo nelas estava mais certo do que em mim. Começei a achar que errei feio em quase todas as escolhas, mas sei que não há tempo na vida para arrependimentos.
Acho que foi a Lya Luft em " Perdas e ganhos" que disse que a vida era mais ou menos isto, cada escolha impõe sempre um ônus, mais cedo ou mais tarde. Tudo tem desdobramentos , consequências que nem sempre são maravilhosas.
Às vezes vejo minhas amigas que tem uma vida dita " mais convencional" alienando para seus filhos o aprendizado de tarefas corriqueiras como instalar um vídeo ou manejar uma câmera ou mesmo usar certas ferramentas de um computador. Como se estas fossem tarefas proibidas às donas de casa, mesmo aquelas que não são nada donas de casa. Os maridos ficam encarregados de resolver os problemas domésticos. Assim dizendo , muletas que vão deixando um pouco que outros pensem sobre coisas que à mãe e esposa não cabe opinar. Vão ficando as mulheres um pouco aleijadas em sua formação. Fazem tricot e assistem novelas. Este capítulo eu acho sofrível.
Acho terrível que as mulheres fiquem do lado da casa que não gosta de discutir política , futebol ou fórmula 1. Me incomodam as revistas femininas que trazem opiniões altamente alienantes sobre o universo de uma mulher. ( É claro que há o capítulo das grandes maravilhas fúteis do mundo feminino, o que tem justificativas culturais muito óbvias)
Aquelas pessoas que me conhecem, claro, aparentemente, vão invariavelmente declarar que sou divertida, criativa, agitada, comunicativa, teatral, inteligente e até bonita. Tudo que oferece o quilate de normalidade e que nos dá credencial no grande ninho social. Mas acho que todos esses conceitos são como aquela chave promocional que deve ligar o carro premiado, parece igual , mas não liga, não dá ignição, não põe a coisa em movimento. Sabe, esqueci minha senha!
Tenho me visto cumprindo metas e fazendo planos de curto e longo prazo, que não cumpro, dos quais fujo. Finjo!
Sinto-me em queda livre às vezes e costumo dizer que todos somos muito próximos do tão temido chão! Como um personagem de Caio Fernando Abreu, tão humano, tão visceral, tão falível, tão fraco , tão frágil e porque não tão verdadeiro e tão apaixonante.
A paixão parece uma armadilha! No " Divã" da Marta Medeiros , há um momento no qual ela afirma que se apaixonou por uma situação, por um conjunto de coisas e não pela suposta pessoa amada. Achei uma definição muito interessante. Aquela pessoa é um gatilho que põe em movimento uma porção de coisas em nós, algumas desconhecidas, outras até mesmo assustadoras.
Aliás , o tempo faz coisas com a gente e com nossos pontos de vista que parece um romance de Gabriel Garcia Marquez. É surreal.
Estou dizendo tudo isso, porque apesar de estar na torre de um corpo de 1. 68 de altura e mais ou menos 60quilos, estou sentido as faíscas de quem está raspando o solo, afinal , dizem que pra baixo todo santo ajuda, mas também estou tangendo as nuvens porque não há nada mais apocalíptico do que a verdade.
Dois extremos muito perigosos! Perigosos? Veja só!
São tantas de mim que aparecem e acho que são todas falsas e fica a pergunta : e agora? Como devo me sentir?
Pode ser que todas sejam eu, provavelmente sejam! Meus dedos estão congelando!
Como um ser mediano age em tais circunstâncias? Mas eu não sou um ser mediano! Eu nem sei o que seria , na verdade , um ser mediano. Tenho medo de seres medianos.
Eu conheço seres pequenos e seres incríveis e seres patéticos e zilhões de pessoas , mas seres medianos eu não conheço nenhum e portanto , não sei como devo me sentir. Só sei que não sinto! Isso me assusta! É como se um belo dia eu tivesse descoberto que o gosto de algo mudou ou que não consigo mais o choro fácil e que olho com indiferença para certas circunstâncias.
Será que estou represando?
Sinto-me como dizia o Renato Russo, inadequada para vida, inapropriada. E como será que é ser apropriado? Ser adequado!
Eu que sempre me achei tão diferente de todos diria que tenho encontrado minha radiografia nos corpos de tantas estranhas criaturas. Talvez porque somos todos empurrados para o mesmo abismo, alguns resistem e vão criando calos e fortalecendo músculos, ganhando imunidade , criando anticorpos , outros simplesmente se deixam levar e se fundem ao movimento do conjunto.Será que eu sou uma impostora?A vida é puro charlatanismo?
Talvez eu só queira mesmo me sentir parte de alguma coisa que tenha rumo! Tipo ter uma carteira de habilitação que me desse passe livre nos outros grupos, sem que eu precisasse estar sempre me justificando ! Me justificando comigo, com o mundo ficcional a minha volta, com o que acho que as pessoas são ou pensam, com os matizes que coloco nelas.
Cheguei à conclusão de que quando me preocupo com o que os outros vão pensar, estou realmente preocupada com o que o meu superego vai pensar, com o que a feitora de todas as escravas que residem neste endereço vai pensar e em que castigo vai me impor por mau comportamento!!
Por outro lado , talvez seja justamente o inverso porque sobram rótulos e prateleiras para nos enquadrarmos . Se saímos de um , caímos em outro. Será que estamos em busca de nosso próprio pecado original? Não queremos pertencer às fileiras de clichês e queremos descobrir que não plagiamos ninguém!Naõ copiei o script e nem decorei as frases certas....